Na noite de 26 de setembro, em San Sebastián, o renomado diretor espanhol Pedro Almodóvar recebeu o prestigiado Prêmio Donostia no Auditório Kursaal, sede do 72º Festival Internacional de Cinema de San Sebastián (SSIFF 72). O prêmio foi entregue a ele por Tilda Swinton, com quem colaborou recentemente. Há 44 anos, Almodóvar, então com 31 anos, apresentou sua estreia na direção, o longa-metragem Pepi, Luci, Bom e Outras Garotas de Montão, na seção New Directors, no mesmo local.
![Image description](https://img.peliplat.com/api/resize/v1?imagePath=peliplat/article/20241004/6a2b884da9721a0998cf620d86a2cce2.png&source=s3-peliplat)
Para os fãs de Almodóvar, considerado um dos artistas mais influentes do mundo, já fazia um tempo que ele merecia esse reconhecimento por parte do festival de cinema mais importante da Espanha. Entretanto, seu humilde discurso de aceitação talvez sirva como uma espécie de desculpa para essa homenagem tardia: "Na minha idade, um prêmio como o Donostia pode indicar o fim de um caminho e uma recompensa por ter percorrido ele. Mas não vejo dessa forma. Para mim, o cinema é uma bênção ou uma maldição. Não consigo imaginar outra vida senão escrever e dirigir sem parar; o contrário seria um vazio."
Outro reconhecimento, pelo qual Almodóvar esperava há muito tempo, foi o Leão de Ouro de "Melhor Filme" para sua obra mais recente, The Room Next Door no Festival de Cinema de Veneza, no início de setembro, sendo o primeiro prêmio de honra recebido em um dos três grandes festivais de cinema este ano. Talvez, como sugerido em seu discurso de aceitação em Donostia, esses reconhecimentos tardios tivessem como objetivo pressioná-lo e garantir que ele não alcançasse o sucesso tão cedo. Mas ele já não havia ganhado dois Oscars de "Melhor Filme Internacional" na virada do milênio, por Tudo Sobre Minha Mãe e Fale com Ela? Sem contar que ele já ganhou 32 vezes a maior homenagem cinematográfica da Espanha: o Prêmio Goya!
De qualquer forma, graças ao buzz gerado pelo Leão de Ouro, The Room Next Door retornou ao país para sua estreia nacional com o maior nível de expectativa no SSIFF 72. Eu já tinha marcado esse filme como prioridade para a venda de ingressos quando as vendas online começaram em meados de setembro. Naquela época, eu ainda estava em Puerto Madryn, a famosa cidade para observação de baleias na Patagônia, e tinha uma viagem de mergulho matinal planejada para o dia seguinte. Mas, na esperança de garantir um ingresso, ajustei meu alarme para 3h55 e, às 4h (9h no horário da Espanha), eu estava online no momento em que as vendas começaram.
No fim, descobri que os ingressos não foram tão difíceis de conseguir quanto eu esperava e, para mim, o filme em si não trouxe muitas surpresas. Se eu fosse avaliá-lo com uma nota de 0 a 10, seria nota 7; a mesma do filme anterior de Almodóvar, Mães Paralelas. Contudo, eu avaliaria seu trabalho anterior, Dor e Glória, com uma nota 9.
![Image description](https://img.peliplat.com/api/resize/v1?imagePath=peliplat/article/20241004/91645f8ebc3a8ad81bfc017f9ef6c77f.png&source=s3-peliplat)
The Room Next Door é o primeiro longa-metragem de Almodóvar em inglês, adaptado do romance O que você está enfrentando, da escritora norte-americana Sigrid Nunez, protagonizado por duas mulheres talentosas e tão celebradas em sua área quanto o próprio diretor: Tilda Swinton e Julianne Moore.
As realizações cinematográficas de Almodóvar são inseparáveis da pátria apaixonada e vibrante retratada em seus filmes, bem como dos personagens únicos que levam vidas extraordinárias. No entanto, essas vidas extraordinárias sempre conseguem evocar credibilidade e empatia. Sem dúvida, ele é o melhor artista em capturar a intensidade das emoções espanholas. Mas como seria sua transição para o mundo de língua inglesa? Será que ele, assim como outros diretores que parecem perder o brilho de contar histórias ao se afastar da língua nativa, teria dificuldade com essa mudança? Embora Almodóvar acredite que seu trabalho mais recente "permanece espiritualmente em espanhol", alguns dos fãs ainda podem se sentir desconfortáveis sem o mundo familiar da "Espanha apaixonada" que é tão central em seus filmes anteriores. As expressões emocionais das duas estrelas de Hollywood, Swinton e Moore, provenientes respectivamente do Reino Unido e dos Estados Unidos, são mais contidas do que as de seus habituais colaboradores espanhóis, como Antonio Banderas, Javier Bardem e Penélope Cruz. Porém, isso se deve mais ao fato de o material de origem ser um romance norte-americano, em que os temas da morte e do apoio mútuo não exigem manifestações exageradas. As atrizes compreenderam a essência da história e transmitiram uma profundidade emocional mais universal em suas atuações.
![Image description](https://img.peliplat.com/api/resize/v1?imagePath=peliplat/article/20241004/4976cb2b4289e7e15f8fe26247d95b2c.png&source=s3-peliplat)
No filme, Martha (interpretada por Swinton) é diagnosticada com câncer cervical em estágio avançado. À medida que se aproxima do fim da vida, ela é cuidada e apoiada por uma velha amiga, Ingrid (interpretada por Moore), com quem se reconectou recentemente. Ambas as personagens são escritoras: Ingrid está focada em pesquisar o mundo literário do passado, aprofundando-se nas lutas femininas apresentadas em Um Teto Todo Seu, de Virginia Woolf, enquanto Martha está baseada no presente, tendo sido uma famosa correspondente de guerra que arriscou a vida em zonas de conflito. Martha tem um ex-marido que voltou da Guerra do Vietnã mentalmente abalado e uma filha que cortou contato com ela.
As histórias das personagens soam um tanto semelhantes às de Dor e Glória. Swinton chegou a descrever o filme como "estranhamente um sucessor natural de Dor e Glória". Então, Almodóvar está se repetindo?
Na realidade, os temas do envelhecimento e da morte são questões que todos terão de ponderar profundamente, mas nunca resolver por completo. É natural que os artistas revisitem esses temas em suas obras para obter novos insights por meio da repetição. Almodóvar também disse: "uma despedida digna deste mundo é um direito básico de todos". Assim, ao elaborar The Room Next Door, em que Martha é acompanhada de perto pela amiga durante sua jornada final, o diretor escolheu ambientar a história em uma grande mansão — uma obra-prima da arte arquitetônica — nas profundezas de uma floresta pacífica. Esse cenário tranquilo torna-se palco de uma despedida emocionante, na qual Martha, sempre consciente de que alguém no quarto ao lado se preocupa profundamente com ela, pode falecer em paz.
A filósofa Susan Sontag, em sua famosa obra A Doença Como Metáfora, usou a linguagem da guerra para descrever o medo que a humanidade tem da doença. Almodóvar, por outro lado, apresenta um personagem coadjuvante — um homem que esteve romanticamente envolvido com as duas mulheres. Ele é um ambientalista cínico que proclama publicamente sua crença pessimista de que não vale mais a pena salvar a humanidade. Assim, ele se lembra, mas não se sente mais muito apegado à sua ex-namorada, cuja vida está sendo ceifada pelo câncer. Bactérias e vírus podem devastar o corpo humano, tal como a natureza irá inevitavelmente reivindicar a Terra.
Não importa se é raiva ou razão, os pensamentos nascidos da exploração artística não podem ser comparados às emoções complexas que acabarão sendo elevadas no momento da morte. Uma citação do romance Os Mortos, de James Joyce, é mencionada várias vezes em The Room Next Door. O filme e a vida de Martha terminam com a mesma fala: “A neve caindo suave através do universo, caindo brandamente, como a queda final, sobre todos os vivos, sobre todos os mortos.”
![Image description](https://img.peliplat.com/api/resize/v1?imagePath=peliplat/article/20241004/b139cdc8d6090ef51bea13c80ccb1d4e.png&source=s3-peliplat)
Compartilhe sua opinião!
Seja a primeira pessoa a iniciar uma conversa.