Desvendando os mistérios e as camadas escondidas de Longlegs – Vínculo Mortal

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O azarão das bilheterias desses últimos meses, Longlegs – Vínculo Mortal, recebeu críticas mistas. Alguns elogiam sua maestria atmosférica (David Fear, da revista Rolling Stone, disse que o filme é como “uma sensação de pesadelo em longa-metragem”), enquanto outros elogiam o desempenho caracteristicamente selvagem de Nicolas Cage. No entanto, muitos acham que ele prioriza o estilo em detrimento da substância e fica aquém das altas expectativas que a Neon estabeleceu com seu slogan promocional, que dizia ser “o melhor filme de serial killer desde O Silêncio dos Inocentes”.

Todos esses pontos de vista são válidos. Mas, para mim, o elemento mais cativante de Longlegs – Vínculo Mortal não é o enredo em si, mas a variedade de inspirações e fundamentos mitológicos que ele utiliza. O diretor Osgood Perkins elabora uma narrativa com base na literatura clássica, na cultura pop e no histórico familiar, criando um mundo enigmático e fascinante. Os mitos que cercam o filme muitas vezes parecem mais convincentes do que a própria história.

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"Pernalongas"

O personagem de Nicolas Cage (um dos assassinos em série do filme) atende pelo nome de “Longlegs” (“Pernalongas”, em tradução livre, sem referência ao desenho animado), o que pode trazer a imagem perturbadora da Pholcidae, a aranha “Pernalongas”. No entanto, para aqueles que conhecem a literatura clássica, esse nome também lembra o romance de Jean Webster de 1912, Papai Pernilongo, que conta a história de Jerusha Abbott, uma jovem órfã secretamente apadrinhada pelo misterioso e mais velho “Papai Pernilongo”, Jervis Pendleton. Por fim, os dois se conhecem, se apaixonam e se casam.

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Assim como no enredo de Papai Pernilongo, a protagonista de LonglegsVínculo Mortal, Lee Harker (Maika Monroe), é secretamente apadrinhada por seu benfeitor de “pernas longas”, embora não saiba disso. O filme dá a entender que sua maior sensibilidade a ocorrências estranhas e sua intuição são moldadas por “Longlegs” por meio da influência de uma boneca amaldiçoada. De certa forma, ela é uma marionete, manipulada pela força sinistra representada por “Longlegs”, em paralelo à maneira como Jervis molda a vida de Jerusha, como um Pigmalião, por meio de cartas, recomendações de livros e conselhos.

Embora Papai Pernilongo parecesse relativamente inocente para a época, visto pelas lentes de hoje, a história de um homem rico de 30 anos que se apaixona por uma menina órfã de 17 anos levanta algumas preocupações. LonglegsVínculo Mortal também carrega tons perturbadores de pedofilia, com o personagem de Cage, uma figura predatória, indo de casa em casa em busca de meninas para sacrificar. Esse subtexto acrescenta uma profundidade inquietante que se arrasta no plano de fundo da narrativa.

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“Pai! Mãe!”

Osgood Perkins, o diretor de LonglegsVínculo Mortal, pode parecer um cineasta pouco conhecido, mas ao descobrirmos quem é seu pai, fica mais claro de onde vem seu talento para terror — o pai dele é Anthony Perkins, o ator lendário que interpretou o perturbado Norman Bates no filme de terror icônico, Psicose.

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Anthony Perkins era uma figura complexa. Homossexual, vivendo em uma época em que a sociedade não aceitava sua sexualidade, ele acreditava que poderia ser “curado” e até se submeteu à terapia de conversão, tendo se casado mais tarde com uma mulher, o que levou ao nascimento de Osgood. Essa luta interna e o relacionamento tenso com a esposa, sem dúvida, moldaram o interesse de Osgood por doenças mentais e seu fascínio pelo horror. Da mesma forma, Nicolas Cage também vem de uma família proeminente de Hollywood, sendo sobrinho de Francis Ford Coppola. Embora tenha atuado em vários filmes de seu tio na década de 1980, o terror sempre foi seu gênero favorito. Basta ver os títulos em sua filmografia: Um Estranho Vampiro, O Sacrifício, Mandy: Sede de Vingança, Renfield - Dando o Sangue Pelo Chefe (baseado na lenda de Drácula), A Cor que Caiu do Espaço (adaptado da história de H.P. Lovecraft) e agora LonglegsVínculo Mortal.

Cage revelou que sua inspiração para interpretar “Longlegs” veio de sua mãe: “Não que ela fosse satânica”, disse ele, mas testemunhar a luta dela de toda uma vida contra uma doença mental era algo que ele precisava processar. “Em minha abordagem para trazer minhas atuações cinematográficas para um lado mais pessoal, tenho tentado encontrar um lugar construtivo para colocar as lembranças que tenho da minha mãe.” Assim, ele incorporou a linguagem corporal e os padrões de fala de sua mãe em sua interpretação de “Longlegs”.

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A mãe de Cage, Joy Vogelsang, era uma dançarina moderna formal e coreógrafa com um longo histórico de doença mental. Cage relembrou: “Ela ficou internada por anos e passou por tratamentos de choque. Ela entrava em estados que duravam anos. Dizia as coisas mais incríveis, lindas, mas assustadoras. Tenho certeza de que tudo isso teve um impacto sobre mim.”

Joy Vogelsang faleceu em 2021, aos 85 anos de idade.

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Glam Rock e o assassino adorador de Satã

Outro elemento de destaque em LonglegsVínculo Mortal é a estética do glam rock. O porão onde “Longlegs” mora não é adornado com símbolos satânicos, mas sim com pôsteres de Lou Reed e Marc Bolan. Marc Bolan, a força que impulsionou a banda T. Rex, fornece a trilha sonora de abertura do filme. Em vez de citar a Bíblia ou o Paraíso Perdido, Osgood Perkins começa seu filme com a letra do hit Bang a Gong (Get It On) da T. Rex.:

“Well you’re slim and you’re weak

You’ve got the teeth of the hydra upon you

You’re dirty, sweet, and you’re my girl.”

“Bem, você é magra e fraca

Você tem os dentes da hidra sobre você

Você é suja, doce e é minha garota.”

– Em tradução livre

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Discutindo a presença marcante do glam rock em LonglegsVínculo Mortal, Perkins explicou que a escolha foi puramente intuitiva: “O material da T. Rex não tinha nada a ver com o enredo — mas tudo a ver com a energia do filme”. Ele foi mais além, explicando que as músicas da T. Rex eram a mistura perfeita de “poesia bíblica, demoníaca e glam rock”.

É interessante notar que as músicas da T. Rex sempre foram uma das favoritas dos cineastas. Quentin Tarantino usou Jeepster em À Prova de Morte; Clube de Compras Dallas apresentou Life is Strange com destaque e até mesmo G.I. Joe: A Origem de Cobra incluiu Bang a Gong (Get It On). Mas talvez o diretor mais apaixonado pela T. Rex seja Edgar Wright, que usou a voz característica de Bolan em Chumbo Grosso, Scott Pilgrim Contra o Mundo e Em Ritmo de Fuga.

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