A Moonee e o Scooty passeiam no estacionamento com a Jancey, uma garota que acabam de conhecer. Os símbolos hiper-reais da Flórida estão por todos os lugares, junto com motéis dilapidados, espaços abertos vazios e apartamentos abandonados, constituem um lugar de jogos para as crianças.
Pouco depois do início do filme, a Moonee e o Scooty estão sentados em frente a um quadro. Esta pintura mostra a um menino dando uma laranja a uma menina. Este é um símbolo da exportação de laranjas da Flórida. O texto na pintura diz "Leve um pouco para casa" e "Bem-vindo à Flórida".
Esta pintura retrata uma imagem utópica mítica cheia de cuidado, saúde e produtividade. Em contraste com esse estado, os personagens na realidade estão sofrendo com a pobreza - as duas crianças estão esperando o almoço com as sobras de comida oferecidas pela Ashley, que trabalha na padaria de waffles.
Da mesma forma, a loja "Orange World" onde as crianças correm tem um exterior enorme em formato de concha de laranja e está alojada em uma série de estranhos prédios em formato de desenho animado, incluindo uma loja de presentes da Disney decorada com feiticeiros e sereias gigantes, e sorveterias em forma de sorvete. Esses prédios servem como imitações clássicas, que não são exemplos de nenhuma vida real, mas exemplos de imagens relacionadas com a Disneylândia da Flórida.
O hiper-real não é irreal, mas, como diz o Jean Baudrillard, é uma fantasia super-real.
O surgimento de fenômenos hiper-reais está intimamente relacionado ao consumo visual demandado pelo público, mas a existência da Disneylândia é para esconder o fato de que o mundo americano real é a Disneylândia real (Jean Baudrillard, 1994).
Eco diz que a Disneylândia é apresentada ao mundo como um mundo imaginário, mas é para fazer às pessoas acreditarem na autenticidade do mundo fora do parque. Dessa forma, toda Los Angeles, Flórida e até mesmo os Estados Unidos não são mais reais. Eles formam um mundo "irreal" simulando o mundo hiper-real. A Disneylândia não é mais uma representação do mundo real original, mas, em vez disso, esconde o fato de que o mundo real não é mais real (Yang, 2014).
Em "The Florida Project", o Sean Baker considera a Disney World uma abreviatura para uma fantasia social americana inexistente, pura e sem problemas, mas ele reflete a sociedade real através da caracterização e dos detalhes.
O diretor repetidamente entrelaça a fantasia da Disney com o desespero da realidade dos personagens para formar um forte contraste.
Por exemplo, nesta cena (figura 1 abaixo), a Halley discute seu desemprego com a equipe do Departamento de Serviços Sociais, xingando à mulher em primeiro plano no lado direito da tela, enquanto a Moonee está na segunda metade da tela, brincando carinhosamente com uma boneca princesa.
A diferença entre o mito do entretenimento e a realidade da sociedade americana é revelada por meio de uma estrutura visual.
Em outra cena (foto 2 abaixo), a Halley para em um passeio e leva à Moonee e à Jancey para a grama ao lado de um pequeno lago para comemorar o aniversário da Jancey. No momento em que as velas são apagadas, o mundo inteiro escurece. No entanto, os fogos de artifício na Disneylândia não muito longe explodem no ar no segundo seguinte, iluminando às três garotas.
A Halley sorri e diz que esses são os fogos de artifício do aniversário da Jancey. Os fogos de artifício da Disney florescem à meia-noite, representando um romance de sonho, mas na realidade elas não podem nem pagar um bolo de aniversário de verdade. As duas condições de vida estão em nítido contraste.
No final do filme, a equipe do Serviço Infantil chega e se prepara para mandar à Moonee para outra família, o que leva à separação da mãe, e ela foge. Ela corre para encontrar à Jancey e começa a chorar. A Jancey pega a mão dela e saem correndo.
Neste momento, a mudança dramática na música e no estilo visual do filme mostra que entramos em um mundo de fantasia. Pela primeira vez, vozes não narrativas substituem às vozes naturalistas, anunciando a entrada no espaço da imaginação.
Na perspectiva em primeira pessoa, a câmera mostra às crianças galopando pelo espaço onde costumam brincar, entrando no mundo da Disney sem esforço. O diretor usa um iPhone 6s portátil para imaginar um mundo. Neste mundo, as barreiras dos espaços comerciais privados fechados são rompidas, o que traz um impacto dinâmico ao público. A lente da câmera portátil passa por uma família em pé para tirar fotos e depois caminha em direção ao Castelo da Disney.
Esta série de imagens representa a vitória da imaginação e da amizade entre as duas meninas, mas também enfatiza que a Moonee não tem outra escolha a não ser se refugiar na fantasia de uma criança: poder entrar no reino da imaginação.
O cerne deste filme é a tragédia. A família que se levanta para tirar um retrato de família é provavelmente uma família feliz na fantasia de todos, mas o que a Moonee pode fazer em sua fantasia é entrar neste mundo de conto de fadas em que geralmente é difícil se envolver.
O filme também sugere que a Disney não é um monopólio dessa utopia imaginária: para as crianças, o motel e o ambiente ao seu redor podem se tornar uma utopia por meio de sua imaginação e experiência.
A Moonee leva à Jancey por uma floresta e diz a ela: Olha, eu levo você em uma viagem de caça.
Para as crianças, a utopia não existe na forma de entretenimento pago, mas sim na felicidade e vitalidade que trazem para o meio envolvente e para o imaginário coletivo.
Sob a cor da fantasia, este filme conta a vida das pessoas marginalizadas no reino da fantasia e na Disneylândia a partir da perspectiva das crianças. O mundo infantil é repleto de infantilidade e ao mesmo tempo entrelaçado com o hiper-realismo. O cerne da tragédia está escondido sob a casca dos contos de fadas.
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