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"Upgraded: As Cores do Amor" | Quando o romance e a síndrome do impostor se encontram

Spoilers

Ao se chocarem, o romance e o mal-entendido podem resultar em um passeio de montanha-russa ou em um incêndio destruidor. Infelizmente, Upgraded: As Cores do Amor (2024) se enquadra na última categoria. Primeiro preciso esclarecer que gosto de comédias românticas. É só me dar uma caixa de lenços de papel que já estou pronta para chorar com histórias de amor. Quero dizer, até Amor à Primeira Vista — um dos filmes românticos mais sem graça da Netflix e com avaliações medíocres — conseguiu me fazer chorar. E Que Horas Eu Te Pego?, com Jennifer Lawrence, que muitos acharam chato, eu achei bastante envolvente. Mas dessa vez, simplesmente não posso deixar passar. Upgraded me causou todos os tipos de desconforto.

Protagonizado pela adorável Camila Mendes (de sete temporadas de Riverdale) e pelo galã Archie Renaux (de duas temporadas de Sombra e Ossos), esse filme chegou ao Amazon Prime pouco antes de 14 de fevereiro e está em alta desde então. A história acompanha a estagiária Ana, que, após um upgrade inesperado para a primeira classe em um vôo, conhece o rico Will. Mesmo assim, Will confunde Ana com sua chefe, Claire, quando na verdade ela é apenas a terceira assistente de Claire. Ana concorda com essa mentira inocente. Mal sabia ela que isso desencadearia uma série de eventos em que ela teria que continuar inventando uma mentira após a outra para sustentar a farsa, até que tudo ameace desmoronar.

Definitivamente não estou sofrendo da "síndrome do impostor", mas assistindo a esse filme, eu poderia muito bem estar. Mas o que é a síndrome do impostor? Geralmente acontece no local de trabalho: uma pessoa se sente constantemente uma fraude, incapaz de atribuir seu sucesso às próprias habilidades, sempre com medo de alguém descobri-la. Sim, fui eu assistindo a esse filme. Fiquei envergonhada por Ana! Cada vez que ela contava outra mentira, era como se meu corpo todo gritasse: "Não! Chega! Se valorize, mulher!"

Vamos dar uma olhada em algumas de suas mentiras e, mais importante ainda, no contexto dessas mentiras. Quando Will a confunde com a diretora da filial de uma casa de leilões em Nova York, Ana ri, faz uma pausa e, um segundo depois, "confessa" ser a diretora mais jovem da história da empresa.

É preciso dizer que Camila Mendes fez um ótimo trabalho nessa mudança de expressão.

Na segunda vez, quando Will e sua mãe Catherine gentilmente oferecem a Ana uma carona até o Carlson Hotel, Ana é mais uma vez questionada sobre o cargo. Ela opta por mentir novamente, acrescentando mais "detalhes".

Na terceira vez, Ana usa seu status de impostora para conseguir ingressos para "Sonho de uma Noite de Verão" com socialites na festa de Catherine para impressionar sua chefe Claire.

Na quarta vez, Ana pega emprestado, sem permissão, o vestido de gala que Claire pediu para ela passar, usando-o para assistir a uma exposição de arte.

Na quinta vez, na exposição de arte, Ana quase esbarra com Claire, e ela foge rapidamente do local. Mais tarde, Will a acompanha de volta ao hotel, e Ana mais uma vez o leva ao Carlson Hotel (a essa altura, sabemos que é onde a chefe e os colegas de trabalho estão hospedados, mas ela não). Ela espera ele sair e sai logo em seguida, voltando para o motel chinfrim onde está hospedada.

Na sexta vez, usando novamente seu status de impostora, Ana sai com Will e faz com que ele reserve assentos para impressionar Claire.

As mentiras continuaram se acumulando, como uma bola de neve. De fato, essa narrativa é muito eficaz, chamando a atenção do público e deixando-o com vergonha. Mas isso precisa ser feito com maestria!

Embora as mentiras iniciais sejam um tanto compreensíveis, o uso que Ana faz do status de impostora para promover os próprios interesses mais tarde torna-se cada vez mais perturbador. Porque essas mentiras posteriores não são apenas inocentes — elas carregam um tom perigoso e egoísta. Mas esse não é o verdadeiro problema. A verdadeira questão é que Ana não sente genuinamente pena de suas ações. Isso se manifesta de duas maneiras: primeiro, enquanto ela está ansiosa, ela nunca pensa em contar a todos sobre seus erros até que eles sejam inevitavelmente expostos. Em segundo lugar, suas tentativas de se livrar dos dilemas morais são fracas. Ela se esforça ao máximo para convencer aqueles que engana de que não ela tem escolha nem culpa. Ela apresenta ao público mal-entendidos, motivações, desejos e desamparo sob suas mentiras. Mas é claro para qualquer pessoa com um olhar perspicaz que esses argumentos são apenas uma armadilha e uma evasão do verdadeiro problema. Assim, no final, minha "síndrome do impostor" permanece incurável.

Talvez o roteirista devesse ter se esforçado mais para resolver esse ponto sensível. Se fosse um ambicioso thriller policial sobre como uma mulher sobe na hierarquia das estruturas de poder, eu não teria reclamações. Mas é uma comédia romântica! Valores reconfortantes são um aspecto essencial das comédias românticas. Eles não deveriam sobrecarregar o público com dilemas morais do início ao fim, fazendo com que não se abale.

Na verdade, não muito depois do início do filme, comecei a me sentir desconfortável com os valores da história. Foi durante a cena em que Ana chamou pela primeira vez a atenção da chefe Claire ao encontrar um erro de impressão em um folheto de leilão. Depois disso, Claire humilha publicamente a funcionária que comete o erro e elogia Ana na frente de todos. Adivinhe com Ana reage? Ela está nas nuvens, comemorando na festa. Qual é o problema disso? Talvez em muitos filmes sobre o amadurecimento no local de trabalho, isso não seja um problema. Mas na minha opinião, os protagonistas que ganham oportunidades para si próprios ao expor os erros dos outros, não deveriam rir por último.

É claro que Upgraded é emocionante. Ficamos esperando o castelo de cartas de Ana desabar a qualquer minuto. Mas no que diz respeito às comédias românticas, não foi muito certeiro. Se você estiver procurando por uma história de amor com a bússola moral apontada para a direção certa, vale a pena dar uma chance para Encontro de Amor.

Há mais uma questão que vale a pena considerar: as comédias românticas não podem ter valores um pouco excêntricos ou não convencionais? Claro, elas podem. Mas exigem um alto nível de habilidade. Por exemplo, Tudo Pode Dar Certo, de Woody Allen, (embora possa não ser apropriado mencioná-lo agora) com seu niilismo, foi abraçado pelo público, que riu genuinamente das situações e atitudes moralmente ambíguas de cada personagem. Acredito que essa seja a magia de fazer filmes!

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