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Frasier: uma jóia atemporal que continua a ressoar no mundo de hoje (Parte 2)

Spoilers

Frasier: Um dos personagens mais icônicos da história das sitcoms

Embora Frasier carregue o nome de seu protagonista no título, a série não se concentra apenas nele. Na verdade, ela se diferencia ao evitar colocar seu personagem principal em um pedestal. Em sua essência, a história satiriza a vaidade da classe média.

Ao longo da série, chamam a atenção as várias buscas de Frasier por uma vida luxuosa; por exemplo, ele mora em um apartamento com vista para o icônico Space Needle de Seattle e valoriza o ecletismo quando se trata de decoração – se a peça de mobília for cara, vai se misturar naturalmente. Também sente prazer em dirigir veículos importados, deliciar-se com gastronomia de primeira e usar ternos feitos à mão.

O personagem é frequentemente descrito como vaidoso, narcisista e arrogante. Ele tende a se gabar e se considera intelectualmente superior, mas sua justiça própria é frequentemente refutada quando comete erros e tenta consertar as coisas de maneiras inúteis. Esse contraste entre sua inteligência e a realidade é uma fonte de humor.

Em um episódio, Frasier convida um pintor para ir a sua casa admirar uma pintura e acaba descobrindo que é uma falsificação. Em suas tentativas de subir na escada social, recorre à bajulação, mesmo que signifique comprometer sua integridade. Os criadores não se desculpam por destacar as falhas de seus personagens, e o uso de sátira e sarcasmo em relação à classe média é um tema recorrente ao longo da série.

Apesar de suas deficiências, é difícil não gostar de Frasier. Kelsey Grammer, que interpretou o personagem por duas décadas, o descreveu como "burro, arrogante, narcisista e imperfeito", mas também como "gentil" e "vulnerável". Como personagem, suas falhas o fazem parecer real, enquanto sua bondade e vulnerabilidade o tornam cativante.

O velho Martin acha problemática a natureza indecisa e hesitante dos dois filhos. Eles sempre levam em consideração os sentimentos dos outros, o que os leva a repetir seu comportamento e dificulta a tomada de decisões.

Frasier e Niles são conhecidos por seus rígidos limites morais; até seus corpos reagem quando cruzam a linha: faz Frasier vomitar e o nariz de Niles sangrar. Como milhares de pessoas comuns, esses personagens imperfeitos, mas gentis, estão destinados a enfrentar conflitos e sofrimento pelo resto de suas vidas.

Grammer ganhou quatro Emmys de Melhor Ator em Série de Comédia por Frasier, enquanto Pierce ganhou quatro de Melhor Ator Coadjuvante.

Humor sofisticado: comédia para um público maduro

Frasier é uma comédia que atende especificamente a um público maduro, reflexo da faixa etária dos atores. Ao contrário de comédias mais recentes, Frasier consegue manter o humor sem recorrer a palavrões. Apesar de uma linguagem forte, particularmente do colega de Frasier, "Bulldog" (Dan Butler), a série não depende de palavrões excessivos ou vulgaridades.

Mas isso não significa que Frasier seja conservadora, pelo contrário, a série aborda sem medo temas como sexo e amor.

Frasier, um solteirão, procura pelo amor verdadeiro desde seu retorno a Seattle. Enquanto isso, sua parceira de trabalho, Roz, dormiu com quase todos os tipos de homens da cidade, mas se recusou a ligar para Frasier.

Niles se casou com Maris, uma mulher rica, mas começou a desenvolver sentimentos por Daphne, a cuidadora de seu pai. Enquanto isso, Martin, que perdeu a esposa, continuou navegando em sua paisagem emocional. A série também retrata "Bulldog", um radialista insatisfeito movido pela libido, ao lado de Gil (Edward Hibbert), outro radialista que luta para aceitar sua sexualidade.

Os personagens são descaradamente abertos sobre seu desejo por sexo, mas têm dificuldade em encontrar o amor verdadeiro, e sua busca provoca diversão e preocupação do público. Suas perspectivas sobre sexo e amor podem ser desconcertantes e divertidas às vezes, ao mesmo tempo que são profundas o suficiente para deixar as pessoas sem palavras.

Em uma comédia, a principal fonte de humor deve surgir do contraste entre os personagens e a realidade, bem como entre os próprios personagens, impulsionando a trama. Diálogos lúdicos e piadas ousadas ocasionais podem servir como adornos e adicionar sabor. Sem esse equilíbrio, a comédia corre o risco de se tornar o que se tornou Duas Garotas em Apuros em sua sexta temporada, contando apenas com piadas grosseiras e palavrões, e carente de substância.

Frasier elaborou o diálogo do programa para retratar com precisão os personagens e o enredo, ao mesmo tempo em que elevou o nível geral do vocabulário usado. Como psiquiatras, Frasier e Niles gostam de mostrar seus conhecimentos por meio de longas frases que, às vezes, se tornam uma série de pensamentos conectados.

Durante uma conversa, Daphne perguntou por que parecia mais fácil para os membros da família se amarem do que se darem bem. Frasier respondeu que essa dinâmica adiciona cor às nossas vidas e garante "emoção" para os psiquiatras.

Quando Niles substituiu Frasier como radialista, ele declarou: "Não acredito em Freud, portanto não discutiremos o complexo de Édipo hoje. Prefiro seguir os ensinamentos de Jung."

Em 2004, a Slate, uma revista digital, declarou o fim das sitcoms voltadas para adultos após a conclusão de Frasier. Dez anos depois, Flavorwire, outra revista, falou sobre a televisão americano e se referiu aos dez anos do fim de Frasier como a morte lenta de uma sitcom canônica.

Novos começos: abraçando um novo capítulo

Com a ascensão de novos gigantes, como Netflix, Amazon e HBO, redes de TV tradicionais como NBC, CBS e Fox estão buscando maneiras de se adaptar com spin-offs e reboots de clássicos. Programas como Better Call Saul e The Good Fight mantiveram o nível de excelência de seus antecessores, enquanto as novas versões de Arquivo X, Prison Break, Twin Peaks e Will & Grace reacenderam com sucesso a nostalgia dos fãs.

Os criadores de Frasier foram questionados sobre a possibilidade de um reboot, mas só em 2018, após o falecimento de John Mahoney, intérprete do pai, que consideraram a ideia.

Quase duas décadas depois, o tão esperado reboot ganhou data de estreia, que deve ocorrer em outubro. Em vez de ser ambientado em Seattle, como o original, a nova série se passará em Boston, a mesma cidade de Cheers, e contará com um elenco completamente novo. É mais uma sequência do que um reboot tradicional.

No último episódio da décima primeira temporada, o personagem recitou um poema de Ulisses, obra do poeta britânico Alfred Tennyson, para seu público:

Pode ser que os abismos nos levem para baixo,

Pode ser que toquemos as Ilhas Felizes,

Não somos aquela força que antigamente,

Moveu a terra e o céu; aquilo que somos, nós somos,

Enfraquecido pelo tempo e pelo destino, mas forte na vontade,

Esforçando-se, buscando, encontrando e não cedendo.

A decisão de Frasier de deixar Seattle e voltar para Boston sugere que está em busca de uma nova vida. Como fã, às vezes tenho dificuldade em ver a série apenas como uma comédia, já que seu protagonista, como Sísifo, está sempre lutando pelo progresso, mas nunca alcançando seus objetivos. É absurda e trágica, muito parecida com a vida real.

Em um mundo onde finais felizes são a regra, Frasier serve como um lembrete de que a vida, muitas vezes, pode ser absurda. No entanto, apesar do absurdo, vale a pena se divertir.

Leia a primeira parte:
Frasier: uma jóia atemporal que continua a ressoar no mundo de hoje (Parte 1)

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